Vitorino Bernardo: um dos maiores impulsionadores do desporto e cultura em São Brás
“(…) Sempre me lembro do meu pai, um apaixonado pelo convívio, por festas (…) com a sua famosa Ford-Transit, carregada de pessoas, lá íamos nós.”
Vitorino Pedro Bernardo, natural de Santa Catarina da Fonte do Bispo, veio para São Brás de Alportel, após vários anos emigrado na Alemanha, foi um nome que marcou a nossa terra pela sua entrega ao futebol local, mais propriamente, às Águias da Mesquita, mas também à União Sambrasense.
Uma vida passada entre a Alemanha e Portugal, com o falecimento da sua mãe aos 18 anos, casou muito cedo, aos 23 anos com o amor da sua vida, Maria Irene Correia, do qual nasceram três filhos. A vida pessoal, não foi das mais fáceis, pois com o falecimento do seu pai e de alguns irmãos, teve que começar a trabalhar, ainda muito novo, para dar assistência à mãe e a outros familiares, deixando para trás a vida escolar, terminou a 4ª classe já em adulto, para poder tirar a carta de condução. Foi também dispensado da vida militar, pelo mesmo motivo.
Sendo ele um lutador e um criativo, no início dos anos 60, já casado e com uma filha, teve como atividade, uma taberna em Santa Catarina (na altura chamava-se de venda), com minimercado, onde também, por gosto, fazia petiscos para os amigos, jogava-se às cartas, o convívio era permanente, colocavam a conversa em dia, falando dos assuntos da época. Em simultâneo e, com a sua motorizada vendia os legumes da época, como favas, ervilhas, feijão, batatas e também peixe, porta a porta.
A vida de emigrante passou pela cidade de Dortmund, para onde emigrou sozinho nos finais dos anos 60, levando um ano depois a esposa e a filha mais velha, para procurarem uma vida melhor. Trabalhou inicialmente numa fábrica de extintores, depois numa fábrica de artigos em estanho, juntamente com a mulher e a filha e mais tarde com os outros dois filhos e já só com a esposa numa fábrica de artigos de plástico.
Naquela altura já era um grande amante do convívio, por isso nos seus tempos de lazer, fazia parte da organização do Centro da Comunidade Portuguesa, daquela cidade, onde entre muitas iniciativas, nasceu também um grupo folclórico com danças do Continente e da Madeira, onde Vitorino desempenhava o papel de motorista do grupo e a esposa era a vocalista. O grupo chegou a fazer atuações junto de outras Comunidades Portuguesas de emigrantes, no país e fora do país. Também fez parte de um clube português de futebol, onde ainda jogou alguns anos.
Ao voltar para Portugal, para além de reativar o telheiro em Santa Catarina da Fonte do Bispo, que na altura só trabalhava na época de verão, ainda criou um minimercado ambulante, com a sua Ford-Transit branca, com fruta e legumes, percorria algumas zonas mais isoladas do nosso Algarve, fazendo a venda dos mesmos, na época do inverno.
Como referido, o bichinho pela bola, não ficou esquecido enquanto emigrante, mas foi já em São Brás que deu asas a esta paixão e resolveu reativar um clube, criar uma equipa e realizar torneios que ficaram na memória dos sambrasenses.
O filho, Ricardo Bernardo, contou-nos um pouco como surge o Águias da Mesquita: “Ele sempre gostou muito de futebol. E o grande sonho era criar um clube na Mesquita, então, ficou a saber que já tinha havido as Águias Mesquitenses, tratou de arranjar uma equipa e reativar o clube, começaram a fazer eventos e a participar em campeonatos nos anos 80 e 90. Passaram de 8 equipas para 18, era mesmo um fenómeno no futebol, marcando essa geração. Mais tarde, esteve ligado à União Sambrasense, onde foi durante 10 anos, diretor de Juvenis, Juniores e também seniores. Também a minha mãe criou um grupo de cantares e charolas. “
Vitorino era um grande impulsionador do desporto e também da cultura, outra das suas grandes paixões, que também se entregou de corpo e alma, ao dar continuidade aos Bailes da Mesquita, feitos no armazém de que era proprietário, junto à casa de residência da família e mais tarde as Festas da Ameixa, que chegou a trazer grandes cantores que estavam no início da carreira e hoje são de renome em Portugal (como por exemplo o Domingos Caetano, o eterno vocalista da Banda IRIS).
Durante vários anos, foram considerados os maiores e os melhores bailes da região. Ali se fizeram muitos bailes temáticos (carnaval, da pinha, concursos de dança, entre outros).
Iniciou os “bailaricos”, como lhe chamava, nos anos 80 com um gira-disco, que tinha trazido da Alemanha, comprando já cá os disco de vinil, dos maiores artistas da atualidade e dentro das várias categorias (slows, rock, samba, tango e valsas). Com a evolução dos tempos, nos anos 90, preparou o recinto para começar a receber os “tocadores ao vivo”, expressão também muito utilizada por ele, passando por lá alguns músicos da nossa terra, terra de coração, que ele acolheu como sua para viver do resto da sua vida.
Com a sua grande energia e alegria, que lhe eram características, não parava, para ele “…parar era morrer…”, quando chegava o tempo da “Quaresma”, não era permitido fazer bailes, no mesmo local fazia as chamadas “RIFAS”, era a expressão e o entretimento, muito usado naquela época. Realizavam-se aos sábados à noite e aos domingos à tarde, que consistia em jogo de cartas e lotos, com apostas feitas com rebuçados.
“Sempre me lembro do meu pai, um apaixonado pelo convívio, por festas, pelas matanças do porco, onde era ele o matador, recordo-me também com grande saudade das enormes passagens do ano que se fazia no nosso armazém, ou em outros armazéns de pessoas próximas, com grandes amigos e que, acabavam quase sempre no Cerro de São Miguel ou na praia da Fuzeta para ver o nascer do Sol e tomarmos todos juntos o primeiro pequeno almoço do ano. Ele com a sua famosa Ford-Transit, carregada de pessoas, lá íamos nós, em que não precisava de cinto de segurança, nem havia controle no limite de passageiros…outros tempos!” contou-nos a filha Marita.
O neto Dário herdou a paixão pelo futebol e o avô foi o seu adepto número um até ao último dia da sua vida, acompanhando-o sempre em todos os treinos e jogos.