O Município de São Brás de Alportel presta reconhecida e sentida homenagem, com a colaboração dos seus familiares

Idálio Luz de Brito nasceu a 03 de setembro de 1938, há 87 anos, natural de São Brás de Alportel e esteve na tropa de 1959 a 1962.
A recruta foi em Mafra. Foi depois destacado para Tavira para tirar o curso de sargentos milicianos e quando acabou, foi dar instrução para Caldas da Rainha durante 4 meses e de seguida para Abrantes, depois para manobras em Santa Margarida e regressou a Abrantes para dar nova recruta.
Um dia o Alferes disse-lhe para não ficar aborrecido, mas estava nomeado para ir para a Índia… Foi de férias entretanto e depois, a 8 de março de 1961, embarcou no Niassa, fazendo parte da Companhia de Caçadores nº 8. Foram 20 dias de viagem, ainda recorda. Como eram graduados, tinham a liberdade de ir passear, em conjunto, quando paravam, pois, os dias, todos iguais em alto mar, saturavam.
Chegados à India, o quartel era a 15, 20 km de Vasco da Gama (capital de Goa). Eram 4 furriéis milicianos, rendiam-se, guardavam os presos, cento e tal, uns portugueses e outros indianos. Era arriscado porque tinham de estar em contacto com eles, abrir a cela, quando iam levar a comida. Quando vinha a noite, tinham de os contar, era o pior, tinham de abrir a porta e entrar lá dentro, teve sempre o pressentimento que podia acontecer qualquer coisa…
Estava sempre um furriel miliciano acompanhado com dois praças. Uma vez entraram numa caserna e eles muito sérios, tinham em cima de uma cama um punhal que usavam na cozinha. Serviu de emenda para terem cuidado, eram falsos… Idálio recorda, em detalhe, cada um destes momentos: “Um desses presos era professor, era mesmo mau, procurava arranjar sarilhos para os aborrecer. Um dia aparece à porta a chamar, tinham um homem com a cabeça ligada. Tinha chovido, havia um pingueiro, queriam que arranjassem. Queixou-se que o homem caiu e bateu com a cabeça e que precisava de ir ao médico. O médico viu que ele não tinha nenhum ferimento, eram ideias do professor.”
Relata quando foi a invasão da Índia: «foi muito chocante porque pensávamos que íamos ser derrotados e que ficaríamos lá todos. Tinham um efetivo de 70.000 e nós eramos 3.500. A minha companhia foi destacada para uma praia e lá no planalto era o aeroporto e de manhã no dia 21 de dezembro de 1961 começamos a ouvir as metralhadoras longe, agora as balas são para outros. Vinham avançando por terra nas nossas costas e na nossa frente tínhamos uma frota de 7 barcos de guerra e nós tínhamos apenas um, o Afonso de Albuquerque, era tudo impossível para nos defendermos, as armas eram muito poucas. O nosso barco estava ao pé do porto, três barcos de guerra da frente começaram a bombardear o Afonso de Albuquerque… o nosso barco acabou por desistir, teve de recuar e desembarcar toda a tripulação para se salvar. Passado pouco tempo, receberam a ordem de rendição. Juntar as armas todas, pôr um pano branco em cima, depois os indianos haviam de nos vir buscar».
Idálio nunca desanimou, transmitia coragem aos amigos.
As casernas estavam cheias de percevejos, não conseguia dormir uma hora. Teve uma manta, que punha por baixo para dormir no chão, que o acompanhou em todo o tempo de prisioneiro.
Passados 2 meses de estarem prisioneiros, mudaram-nos para o quartel onde tinha estado, foram para as celas dos presos. Recebiam correspondência de familiares e conhecidos. O tal professor tomou-o de ponta e censurava as cartas. Fez riscos vermelhos na carta da sua mãe. Os indianos só castigaram 11 homens que tentaram fugir. Eles saíram do campo e foram-se meter num barco inglês (não longe do Porto Mormugão), comunicaram que queriam ir para a terra deles. O comandante não permitiu, comunicou às autoridades indianas, foram buscá-los e trouxeram-nos prisioneiros para o campo. Foram castigados. O chão era pedra que desgastava, faziam-nos andar descalços, correr o quartel e dois soldados atrás, cada um com uma metralhadora para não fugir. Ao fim de dois dias, já não conseguiam pôr os pés no chão, enrolavam trapos, obrigavam a comer dois pratos, a estar uma hora ou mais de braços no ar. Se voltasse a acontecer com outros, eles também pagavam as consequências.
Passados dois meses, foram para o Porto de Mormugão para mudar de campo de prisioneiros, cheio de restos de minério, temperaturas a 40º, todos sentados no chão, em fila e os indianos com metralhadoras na frente. Começaram a meter em batulões (barcos sem quilha), atravessaram o rio Mandovi de um lado ao outro (10, 12 km), muita ondulação, o rio juntava-se ao Oceano Indico.
A comida recorda bem, era água com arroz. Jogavam à carta. Pediam para tomar banho no rio.
Não havia solução, de um lado, mar, para qualquer lado, estavam entregues às autoridades indianas. Iam ouvindo as notícias até que ouviram que iam ser repatriados. Não podiam ir lá barcos nem aviões portugueses. Fizeram contrato com as autoridades francesas que os transportaram para fora. Saíram todos de avião para o aeroporto de Carachi (Paquistão) e de lá no Vera Cruz para Portugal. Foram 13 dias de viagem.
A 9 de maio, finalmente, desembarca em Lisboa. Os familiares não sabiam da chegada. Uns abraçavam a mulher, outros a mãe, outros os filhos e Idálio Brito não tinha a família à sua espera. Recorda-se que encontrou um casal de São Brás que ia para a Austrália.
Trouxeram-nos até Caldas da Rainha, tinham licença ilimitada à espera de ordem. Passados dois anos, recebeu ordem de fazer o espólio de tudo o que tinha (Faro).
Foi emocionante, no caminho de casa, encontrar a colega de escola, a Zé.
Também não esquece que foi condecorado pelo Dr. Paulo Portas.
Mais recentemente, participou num encontro em Tavira de comemoração dos 50 anos de ida para a tropa.

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Coordenação: Marlene Guerreiro
Textos: Sofia Silva / Verónica Chapuça
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